Luto Perinatal: Entenda a Dor e Encontre Caminhos para a Cura

Luto e Terapia

*Por Daniela Bittar (Grupo Colcha)

A Importância de Falar Sobre a Morte e o Luto 

Falar sobre a morte não a afasta, mas o silêncio pode transformar o desconhecido em um temor que nos paralisa. Como um vento que sopra invisível, a morte é parte do ciclo da vida, ainda que difícil de aceitar. Quando damos voz ao que nos assusta, quando nomeamos a dor e a ausência, começamos a desatar os nós que o luto cria em nossas almas. Especialistas nos ensinam que ao enfrentarmos o fim de um sonho, abrimos espaço para a ressignificação e, com o tempo, aprendemos a conviver com a ausência sem deixar que ela nos defina. No luto perinatal, o impacto é ainda mais agudo, pois é a vida que foi interrompida antes de começar, e é essencial que os pais possam encontrar palavras e lágrimas para expressar o peso dessa ausência. 

O Luto Perinatal: Um Processo Singular 

Perder um filho que mal conheceu a luz desafia o entendimento comum do que é o luto. Não é apenas a ausência de alguém que se amou, mas a ausência de um futuro que se sonhou. Como um livro cujo primeiro capítulo jamais foi escrito, essa perda traz uma dor que abala as fundações da identidade dos pais. Torloni nos lembra que “a morte de um filho é a morte de um sonho”, e quando não há memórias tangíveis, como o som de uma risada ou o calor de um abraço, o adeus torna-se ainda mais etéreo, quase como despedir-se de um sopro de vento. Validar essa dor, acolhê-la com cuidado, é permitir que os pais encontrem um caminho para lidar com o vazio e a saudade de um futuro nunca vivido. 

As Fases do Luto: Da Negação à Aceitação 

Elisabeth Kübler-Ross nos deixou o mapa das emoções que atravessam o coração em luto: negação, raiva, barganha, depressão e, finalmente, aceitação. Mas esse mapa não é uma linha reta; é um caminho sinuoso, cheio de curvas e retornos. Uma mãe, ao perder seu bebê, pode inicialmente se agarrar à negação, como quem tenta segurar um punhado de areia que escorre entre os dedos. Logo, a raiva pode surgir, uma tempestade silenciosa que busca culpados no céu ou na terra. Depois, talvez ela tente barganhar com o destino, oferecendo qualquer coisa em troca de um milagre que nunca vem. E quando a barganha não traz o alívio esperado, a tristeza se instala, profunda como o oceano, até que, aos poucos, a aceitação começa a se desenhar no horizonte, não como um fim, mas como uma nova forma de continuar a viver com o amor que ficou. 

O Modelo Dual do Luto: Oscilando Entre Confronto e Evasão 

Margaret Stroebe e Henk Schut nos presentearam com uma nova visão do luto: a oscilação entre confrontar a dor e se permitir evadi-la. No luto perinatal, essa dança é constante. Durante o dia, uma mãe pode se perder nas tarefas diárias, nas exigências da vida, evitando a dor que paira como uma sombra. Mas, à noite, na quietude que o mundo traz, o confronto se torna inevitável, e a tristeza se revela, forte, densa, como um rio que transborda. E essa alternância, dizem os estudiosos, é saudável. É o movimento entre a lembrança e o esquecimento que permite que o luto se processe de forma menos extenuante, oferecendo momentos de respiro em meio à dor. 

Luto Geral: As Diferentes Formas de Luto 

O luto é a resposta da alma à perda de algo ou alguém que amamos. Pode ser a morte de um ente querido, a partida de um amigo ou até o fim de um capítulo importante de nossas vidas. Freud descreveu o luto como o processo de reconciliação com a ausência, e, embora cada luto seja único, todos compartilham o mesmo fio: a dor da separação. Algumas pessoas atravessam esse caminho com mais rapidez, enquanto outras se veem presas em uma etapa, como se o tempo tivesse parado. No entanto, o que a ciência nos revela é que não há tempo certo para a dor. O luto é pessoal, e cada um de nós precisa de uma rede de apoio, seja de amigos, familiares ou profissionais, para nos ajudar a encontrar a luz novamente. 

O Papel de um Serviço Funerário Acolhedor 

Há momentos em que um simples gesto de carinho pode transformar o luto. Um serviço funerário que acolhe com amor e respeito, que permite que os pais vejam, toquem e se despeçam de seus bebês, ajuda a tornar concreta uma dor que, por vezes, parece intangível. Rituais simbólicos, como guardar uma manta ou as impressões dos pés pequeninos, oferecem um ponto de ancoragem no mar revolto da perda. Funerárias que acolhem não apenas o corpo, mas o coração dos enlutados, que respeitam a espiritualidade e os desejos das famílias, podem suavizar o impacto do luto e permitir que a vida, mesmo interrompida, seja honrada com dignidade e amor. 

Conclusão: Unindo Ciência e Espiritualidade 

O luto é um processo que nos coloca diante de nossa humanidade mais profunda. A ciência nos oferece mapas e modelos, mas é a espiritualidade, o amor que perdura além da morte, que muitas vezes dá sentido à jornada. Quando profissionais de saúde e serviços funerários atuam com empatia e humanidade, eles transformam o luto de uma experiência de desespero em uma oportunidade de cura, crescimento e, quem sabe, aceitação. Porque, no fim, o amor permanece, e é ele que nos guia pelas trilhas sinuosas da saudade. 

Conheça o Autor

Co-fundadora do Sentir Mulher e Sentir Família Psicóloga sistêmica-familiar, com 20 anos de experiência em clínica no atendimento a mulheres, gestantes e puérperas, com enfoque na reestruturação familiar. Especialista em luto perinatal. Atua em atendimentos individuais e tem larga experiência na condução de grupos terapêuticos. Ministra cursos e palestras para profissionais de saúde, supervisão clínica e facilita projetos voltados para a saúde mental em ambientes corporativos. Contribui representando o Sentir Mulher e o Sentir Família em caráter voluntário com trabalhos de caráter social como o Grupo de Apoio às Mulheres - GAMAS e Grupo Colcha de Retalhos, voltado para o acolhimento de famílias enlutadas no período perinatal.

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