O Caminho Que liberta – Percepções Sistêmicas Sobre o Luto

Luto e Terapia

*Lívia Dias

O luto é uma das experiências mais profundas e inevitáveis da vida e, ao mesmo tempo, é um processo natural e necessário para integrar as nossas perdas. É uma travessia que todos, em algum momento, precisaremos enfrentar.


Vivemos diferentes formas de luto ao longo da vida — mudanças, despedidas, ciclos que se encerram. Mas aqui quero falar sobre aquele luto que nos toca no mais íntimo: a partida das pessoas que amamos.
Quando alguém morre, nossa primeira reação muitas vezes é resistir à dor. Queremos ser fortes, seguir em frente sem nos permitir sentir. Fazemos isso porque fomos ensinados a evitar o sofrimento, porque queremos poupar aqueles ao nosso redor, especialmente as crianças, ou simplesmente porque tememos que, se nos entregarmos ao luto, nunca mais sairemos dele.


Mas a verdade é que negar a dor não nos protege, e sim nos aprisiona.

O Amor que aprisiona

Mesmo quando tentamos ignorá-la, a dor encontra formas de se manifestar. Ela se esconde no cansaço constante, na ansiedade, na tristeza sem explicação. Sem perceber, carregamos um peso invisível — um vínculo com quem partiu que se mantém através do sofrimento.


Esse peso não afeta apenas a nós. Ele reverbera na família, nos filhos e até nas gerações seguintes. O luto não vivido pode se tornar uma regra silenciosa, criando um ciclo de tristeza onde viver plenamente parece uma traição ao falecido.


Muitas vezes, nesse movimento, tentamos excluir a lembrança de quem se foi, como se evitar o assunto pudesse impedir a dor. O que não é olhado não desaparece — apenas permanece oculto, impedindo que a vida siga seu fluxo natural.

O Amor que liberta

A única forma de atravessar o luto é vivê-lo. Sentir a dor, dar-lhe espaço, reconhecer que a perda é real. Porque é somente quando nos permitimos sentir que o sofrimento pode se transformar.
A dor precisa de tempo, mas também precisa de movimento. Pouco a pouco, abrir-se para a vida novamente se torna possível. O amor por quem partiu não desaparece — ele apenas é vivido de um jeito diferente, que muitas vezes também chamamos de saudade.


Aceitar a morte não significa esquecer. Significa olhar para a realidade como ela é, reconhecer que a vida inclui a morte e que continuar vivendo não é uma traição, mas uma forma de honrar quem se foi.
O fluxo da vida é maior do que a nossa vontade pessoal. Quando aceitamos isso, encontramos paz, em vez de lutar contra aquilo que não podemos mudar.


O vínculo permanece, mas de uma maneira leve, amorosa e libertadora.

Transformando a dor em força

O amor pode ser um elo que nos aprisiona ou uma força que nos impulsiona para a vida. O amor infantil nos mantém presos ao passado, no apego, na culpa, na sensação de que nunca mais seremos felizes sem aquela pessoa. O amor maduro nos permite seguir em frente sem esquecer. A aceitação nos conecta com a força de quem se foi, reconhece sua história e não paralisa a vida.


Se você sente que está preso na dor da perda, convido a fazer um pequeno exercício:


1. Feche os olhos e visualize a pessoa que partiu.


2. Observe o que sente ao vê-la ali. Tristeza? Culpa? Saudade? Apenas perceba, sem julgar.


3. Agora, diga em voz baixa (ou apenas pense):
• “Isso não deveria ter acontecido.”
• “Se eu tivesse feito algo diferente, essa pessoa ainda estaria aqui.”
• “Nunca mais serei feliz sem ela.”


4. Olhe nos olhos dela, com os olhos do coração. Como ela fica?
Provavelmente triste. Talvez com raiva, talvez desejando que você siga em frente.

Agora, respire fundo e diga:
• “Eu te amo, eu te honro e eu sigo vivendo.”
• “Eu levo você comigo no meu coração e encontro alegria na vida.”

E veja como ela se transforma.
Se você está vivendo um processo de luto, pergunte-se: o amor que estou sentindo me fortalece ou me prende ao passado?

A resposta pode ser o primeiro passo para transformar sua dor em um novo movimento de vida.

Conheça o Autor

Psicóloga clínica, especialista em Terapia Sistêmica e Trauma. Com 20 anos de experiência no desenvolvimento de pessoas e equipes em contextos institucionais e individuais, atuo também na condução de grupos terapêuticos. Além do atendimento clínico de adultos, ofereço palestras, cursos e formações voltadas para o autoconhecimento e a saúde mental e emocional.

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